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Crônica: A Prepotência Segundo W.M

Atualizado: 18 de jun.

Escrever digressões sobre sentidos espanadores de convicções, sobre novos sabores, novos odores nas merdas em que nos comprimimos no cotidiano soam prepotentemente estúpidas quando temos clarice como estrela, como dádiva em nosso receituário cultural.

Lembro da escrotidão, da pequenez que enrubeceram todas as páginas e páginas e mais páginas de rascunhos inacabados na segunda das gavetas da minha mesa de escrita assim que, chegado de um dos sebos que adornam - com certa violência - o marfim do bairro burguês do poço onde me afogo, estirei-me no tapete aos pés da minha cama e devorei a paixão segundo g.h. Bíblia, on the road ou sinônimo que o valha. A prepotência sempre me adornou, digo, até então me adornava com suas melhores concatenações, com suas melhores faculdades decorrentes; não mais que de repente a escrotidão e a pequenez referidas tornaram-se temor às minhas premissas do novo fazendo com que o rumo do porvir por mim conjurado não passasse de lúdica preparação a um não sei indiferente quanto a sentidos - em todas as suas interpretações.

Saí tomar um ar, acabei tomando um porre. Enquanto cabisbaixo refletia sobre como minhas reflexões não carregavam transformações equivalentes à magnitude que creditava às minhas alusões, enquanto semicerrado me distraía fácil e, voltada a reflexão, percebia a pequenez duplamente referida crescendo a proporção de seus limites, ouvi amigos gritando meu nome, o de escritor através do qual venho me reinvento mas que desde aquele há pouco não mais fazia sentido de existência. Senta aqui com a gente!, foi o que fiz.

Notaram meu pálido característico ainda mais pálido, afirmaram e afirmaram a tristeza e entrega com as quais deitei o copo já servido. Entreguei a eles que me ouviam dentre covinhas breves os meus devaneios como quem revela sua vingança à uma estrela cadente, porém nenhum deles havia lido clarice: contudo haviam lido algumas das páginas e páginas e mais páginas que certo dia os entreguei. Seus elogios consoladores baseados nos vértices da minha escrita, enquanto deitava copo atrás de copo, fizeram nascer novos frutos na árvore que se definhava em minha consciência, diferentes porém menos relutantes em sua prepotência: deliciei-me ao pensar que ainda, ao menos bêbado, poderia me bastar. E funcionou.

Sigo ainda crendo no torpor que me encontrou naquela tarde, agora como caminho. Sigo ainda cabisbaixo, a cada passo mais e mais cabisbaixo, isso é fato: se antes estufava o peito procurando nos entulhos daquele sebo-trincheira apenas por novas metáforas que se equiparassem a valia do novo que bem-dizia, agora a cada passo procuro desassossegado por rastros capazes de me tornar ainda mais indefinível. A escrotidão, a pequenez me fazem companhia desde o dia seguinte àquele, quando de ressaca me olhei no espelho e sorri o nome que me dei pela sua possível abrangência, e se ainda escrevo é por, abandonando a prepotência, ter encontrado na paixão pela minha própria busca um sentido que valha a pena de escrever.

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